sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Ele sabe o que diz

    Carioca, nascido nos anos 40 e participante do movimento do Cinema Novo, Arnaldo Jabor sempre soube como analisar a realidade nacional de uma maneira única. Além de ser um incomparável escritor, suas façanhas estendem-se ao cinema e ao mundo crítico mostrando sua opinião sempre apimentada desde as artes, sexualidade, política nacional e internacional, preconceitos, filosofias e até sobre o amor.
    Recebi um e-mail sobre um texto assinado por ele, mas devido a alguns vícios de linguagem incomuns em seu vocabulário, dei uma procurada na internet e li que o texto que recebi era uma obra um pouco modificada de sua original. Porém, a ideia é a mesma e o texto original é mais fabuloso que o recebido. Fiquei pasma como ele consegue transcrever para alguns milhares de caracteres tudo o que sentimos e não conseguimos expressar. 
    E aí vai o que me deixou pensando por alguns longos minutos..



Estamos com fome de amor 
Uma vez Renato Russo disse com uma sabedoria ímpar: ‘Digam o que disserem, o mal do século é a solidão’. Pretensiosamente digo que assino embaixo sem dúvida alguma. Parem pra notar, os sinais estão batendo em nossa cara todos os dias. Baladas recheadas de garotas lindas, com roupas cada vez mais micros e transparentes, danças e poses em closes ginecológicos, chegam sozinhas e saem sozinhas. Empresários, advogados, engenheiros que estudaram, trabalharam, alcançaram sucesso profissional e, sozinhos. Tem mulher contratando homem para dançar com elas em bailes, os novíssimos ‘personal dance’, incrível. E não é só sexo não, se fosse, era resolvido fácil, alguém duvida?
Estamos é com carência de passear de mãos dadas, dar e receber carinho sem necessariamente ter que depois mostrar performances dignas de um atleta olímpico, fazer um jantar pra quem você gosta e depois saber que vão ‘apenas’ dormir abraçados, sabe essas coisas simples que perdemos nessa marcha de uma evolução cega. Pode fazer tudo, desde que não interrompa a carreira, a produção. Tornamos-nos máquinas e agora estamos despreparados por não saber como voltar a ‘sentir’, só isso, algo tão simples que a cada dia fica tão distante de nós.
Quem duvida do que estou dizendo, dá uma olhada no site de relacionamento ORKUT, o número de comunidades como: ‘Quero um amor pra vida toda!’, ‘Eu sou pra casar!’ até a desesperançada ‘Nasci pra ser sozinho!’.
‘Unindo milhares, ou melhor, milhões em meio a uma multidão de rostos cada vez mais estranhos, plásticos, quase etéreos e inacessíveis. Vivemos cada vez mais tempo, retardamos o envelhecimento e estamos a cada dia mais belos e mais sozinhos. Sei que estou parecendo o solteirão infeliz, mas pelo contrário, pra chegar a escrever essas bobagens (mais que verdadeiras) é preciso encarar os fantasmas de frente e aceitar essa verdade de cara limpa.
Todo mundo quer ter alguém ao seu lado, mas hoje em dia é feio, é demodé, é brega. Alô gente! Felicidade, amor, todas essas emoções nos fazem parecer ridículos, abobalhados, e daí? Seja ridículo, não seja frustrado, ‘pague mico’, saia gritando e falando bobagens, você vai descobrir mais cedo ou mais tarde que o tempo pra ser feliz é curto, e cada instante que vai embora não volta mais (estou muito brega!), aquela pessoa que passou hoje por você na rua, talvez nunca mais volte a vê-la, quem sabe ali estivesse a oportunidade de um sorriso à dois.
Quem disse que ser adulto é ser ranzinza, um ditado tibetano diz: ‘Se um problema é grande demais, não pense nele e se é pequeno demais, prá que pensar nele”. Dá pra ser um homem de negócios e tomar iogurte com o dedo ou ser uma advogada de sucesso que adora rir de si mesma por ser estabanada; o que realmente não dá é continuarmos achando que viver é out, que o vento não pode desmanchar o nosso cabelo ou que eu não posso me aventurar a dizer prá alguém: ‘vamos ter bons e maus momentos e uma hora ou outra, um dos dois ou quem sabe os dois, vão querer pular fora, mas se eu não pedir que fique comigo tenho certeza de que vou me arrepender pelo resto da vida’.

Antes idiota que infeliz! 
Arnaldo Jabor






    Espero que, assim como eu, você também tenha ficado pensando em como deixamos a vida passar tão vagamente, achando que estamos nos divertindo ao extremo, mas que na verdade estamos apenas nos enganando. Quem não quer uma pessoa só para te acordar com uma mensagem de 'bom dia', ou até um bilhetinho colado na porta da geladeira com um 'sinto sua falta' rasurado? 
    Isso tudo faz parte dos acertos e erros da nossa jornada. Se não nos arriscarmos, nunca viveremos nem metade do que nos é proposto. Cada pessoa é diferente e tem reações diferentes, então talvez tenhamos que parar de ter medo de nos jogar de corpo e alma em um relacionamento e passar a curtir cada momento. E se tiver que acabar, vai acabar e você vai passar pra outra e viver outros momentos iguais ou melhores que os últimos. 
    Dos meus relacionamentos, utilizo uma das mais perfeitas composições de Vinícius de Moraes para expressar o que espero:

"Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure."
     

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